domingo, fevereiro 24, 2008

Cachorro Filósofo Modernista conversa com seu amigo Gato Tradicionalista

O cachorro, sentado no banco da praça, de óculos escuros e chapéu, filosofava com seu amigo gato que permanecia estirado em um galho de uma árvore próxima, demonstrando a peculiar indiferença felina.


“É amigo, nós da família Canidae (com exceção dos Lobos e Coytes que são minoria e tão retrógrados quanto vocês) estamos anos luz na frente dos gatos. Progredimos no conhecimento dos seres-humanos e de nós mesmo. Atingimos um patamar de status com o qual vocês nem podem sonhar.”



“Bah, Não estou convencido!”



“Meu caro, somos mais de 400 raças enquanto que vocês não chegam a umas 20. Segundo a enciclopédia eletrônica da wikipedia vivem nesse mundo cerca de 400 milhões de cães, enquanto que vocês não devem chegar nem a metade disso. Somos companheiros dos humanos desde os tempos mais primórdios.”


“Dependentes isso sim” (resmungando baixinho). E virando-se depois para o cachorro: – Já que o amigo cão gosta de números e de modernidades da internet, se você digitar “dog” na procura de imagens do google aparecerão 23.200.000 imagens, se digitar “cat” serão nada menos do que 33.800.000 imagens. Se preferir em português, vocês caem para apenas 1.050.000, enquanto que nós somos 4.710.000.”



“Não quer dizer muita coisa, isso acontece por causa dessa mania dos homo-sapiens de chamarem de ‘gato’ e ‘gata’ uns aos outros. Mas me admira logo você, que preza tanto pela “vida natural”, usar o computador e conseguir digitar algo no teclado.”



“Somos mais precisos com as patas do que vocês, meu caro”. “E os humanos também se nomeiam cachorro para se xingar, hiehiehiehie...”



“Nem sempre. Quem é o melhor amigo do homem, hein?!”



Humpf...



“Além dessas picuinhas, meu ponto é que nós cachorros somos bem relacionados e civilizados. Progredimos bastante no último século, e continuamos neste com os avanços entre nós e os humanos. Hoje nós tomamos banho todo dia, aparamos o pêlo, entendemos a linguagem deles e prestamos socorro. Herdamos fortunas e alguns de nós conseguimos até escovar os dentes. Nosso nível intelectual permite-nos comunicarmos e sermos embaixadores dos humanos de maneira muito melhor do que vocês. Eu, por exemplo, vejo o Jornal Nacional todos os dias. Estamos a par da tecnologia e avanços da ciência moderna dos humanos. Quem você acha que os humanos mandaram para o espaço? Um cachorro ou um gato?”



“Uma cadela estúpida que morreu”. Virando-se de costas e olhando para o céu: –“Bom, mandaram um chipanzé também se é que não sabe”. “Vocês se acham humanos, seus estúpidos! Se manca cara! Onde é que vocês fazem cocô? Cagam por tudo quanto é canto, na calçada, no quintal, na sua própria casinha, depois ainda ficam instintivamente jogando bosta pra trás. Nós fazemos em um lugar específico, nossa natureza selvagem não nos impede de sermos asseados. Vocês estão mais próximos dos porcos isso sim!”



“Não perca o argumento, meu caro. O fato é que estamos mais a par dos comportamentos humanos, desenvolvemos melhor o nosso cérebro. Compreendemos o verdadeiro valor da amizade, do companheirismo, somos felizes e sabemos fazer os humanos felizes portanto.”



“Não sei quanto dessa felicidade é verdadeira. Para um cachorro tão inteligente, não entendo o porquê de tanto otimismo, como afirmou certa vez Thomas Hobbes, “o homem é o lobo do homem”. A vida em cooperação é uma mentira que se sustenta apenas na realidade hedonista do ser humano. Todos eles procuram a sua própria satisfação individual, para isso estão sempre em busca do prazer, isso inclui vocês na lista, pobres cães, que são na verdade, nada mais nada menos, que meros itens de consumo dos humanos, nos quais os itens avaliados são a felicidade barata e seus ternos carinhos. Parece que se esquecem da sua “vida de cão”, e da verdadeira condição de subjugados. A melhor maneira do bem-viver é admitir sua individualidade e não se prender a nada, a não ser a sua natureza que lhe é inerente.”


“Isso é estoicismo, conceitos antigos, eu não poderia esperar filosofia melhor vinda de um gato. Então, queres me dizer que somos livres para escolhermos o que bem entendermos? Afirmas que possuímos o livre-arbítrio, porém, essa escolha está atrelada somente ao que nos é da natureza...”. “É um tanto contraditório: você é livre para escolher, mas deve escolher apenas aquilo que lhe dá prazer e benefício individual...”. “Bom, e se eu disser que preferimos o desenvolvimento de laços afetivos e que, apesar do lado vil, nós, assim como os humanos, somos capazes de criar coisas belas e desenvolvermos amizade e amor sem interesse pessoal.” -- Arguciosamente, percebendo que era de apreço de seu companheiro gato, o cachorro volta a uma questão mais antiga: “Se somos livres para escolher entre o bem e o mal porque simplesmente não optamos pelo primeiro?”


“Bem e mal não são conceitos estabelecidos, o que se pode afirmar é que cada um pode conhecer o que é bom para si mesmo, isso não inclui ser ‘bom’ para os outros.”



“Aha! Nós podemos então, escolher viver de acordo com os humanos se é isso que temos como bom para nós.”



“Claro, desde que seja consciente, porém não acho que acho que vocês escolham. Vocês se sujeitam ao ridículo, alguns desfilam por aí de lacinhos e roupinhas, perfumes escolhidos pelos seus donos e não por vocês mesmos (o senhor mesmo traja agora neste momento um chapéu esdrúxulo). E não vejo cachorro que tenha protestado, nenhum que tenha dito “não” e tenha escolhido viver de maneira independente, todos aceitam com muita passividade este estado de coisas”.



“Há os vira-latas (e escolhi o meu chapéu, combina comigo).”


“Bah, os vira-latas são apenas cães sem sorte. Vivem querendo arranjar um dono e viver com todo conforto”. Ao contrário, como diz a canção: ‘Nós, gatos, já nascemos pobres, porém, já nascemos livres’...”



“Não creio, essa dita liberdade que vocês têm é utopia, os gatos “livres” como você diz também dependem dos humanos. Quando domesticados são eles que os alimentam. Como gostamos de dizer “Nenhum cachorro é uma ilha”.



“Caçamos quando nos dá na telha...” O gato sentou-se no galho e apertou a vista para mirar o horizonte longínquo depois virou-se para o cachorro perguntando: - “O que é isso no seu pescoço?”


“Minha coleira, porque?”



“Acho que vem lá seu dono, veja se não é”


O cachorro dá umas fungadas no ar e sai correndo, latindo contente: “Auf, Auf, Auf....”.


“Aê amigão, estou contende de te ver aqui. Ficou aqui no Banco o tempo todo?! Que bom! Nem preciso te prender, hein!”

O dono soltou a coleira de seu cachorro e o incentivou a correr pelo gramado, seguindo-o de perto.

8 comentários:

Anônimo disse...

Ei Victor!
Ahaha....Passei por aqui pra ver o que vc aprontou dessa vez... Ficou legal! Só vc msm!
Bjão

I'm a Rock disse...

A propósito, a Anna me passou esse link legal para saber qual a personalidade de cachorro mais se encaixa no seu perfil:

http://www.segs. com.br/teste- cao.htm

da ISTO É.

Valeu! Obrigado Anna.

Ricardo Agostini Martini disse...

"Bah, Não estou convencido!”

O gato era portoalegrense?

Abs.

mombasca disse...

aê véi! se liga, quadrinhos brasilienses revival nem generation are coming! stay toon!

I'm a Rock disse...

Tio patinhas falava "Bah!" Mas a julgar pelo ceticismo e tradicionalismo deve ser de POA sim!

mombasca disse...

à mão!? tu é doido! rs

a retícula foi no computer.

I'm a Rock disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
I'm a Rock disse...

A conferir:

http://www.paralerepensar.com.br/vanessacvaz_cachorro_
tambem_egente.htm